Rumo perigoso
Em simultâneo com o alargamento a mais dez estados, estão em curso na União Europeia profundas alterações políticas que terão importantes consequências para Portugal se entretanto não forem acautelados os interesses nacionais.
Para os deputados do PCP, Ilda Figueiredo e Joaquim Miranda, importa na actual fase «intervir com firmeza para salvaguardar justos interesses económicos e sociais» e garantir o futuro do nosso país com «Estado soberano e independente».
Numa declaração divulgada na passada sexta-feira, 17, os dois eurodeputados caracterizaram os processos europeus como «uma permanente fuga para a frente, sem uma ponderação sobre os problemas existentes e sem um estudo aprofundado das suas consequências», numa via que é «cada vez mais centralizadora e federalista, menos democrática e participativa, a que se junta uma falta de sensibilidade social e um maior domínio dos interesses financeiros e das multinacionais e das grandes potências da União Europeia».
Dos três próximos acontecimentos «fulcrais para o futuro», particular atenção é dada à Cimeira da Primavera, onde será analisada a «Estratégica de Lisboa», três anos após a sua adopção durante a presidência portuguesa (ver peça em baixo). O alargamento da União e Convenção que actualmente prepara a revisão dos tratados e a próxima conferência intergovernamental são outros «processos preocupantes» que confirmam «as principais linhas estruturantes da UE: o neoliberalismo, o federalismo e o militarismo», afirmam os deputados do PCP.
Alargamento
sem coesão
Face ao actual quadro financeiro, o alargamento a mais dez países «coloca em causa a concretização do princípio da coesão económica e social inscritos nos tratados». Esta situação é tanto mais grave, acrescentam os deputados, quanto «Portugal é apontado como o país que será mais prejudicado (e a Alemanha aquele que mais ganhará), num contexto em que serão acentuadas a concorrência, as deslocalizações de empresas, os perigos de perda de investimento e de parte dos fundos comunitários a partir de 2006».
Por isso, para os comunistas, é incompreensível que o Governo PSD/CDS-PP tenha aceite o quadro financeiro definido na Cimeira de Copenhaga que estabelece desde já limitações quanto às negociações após 2006. «Isto sem que tenha sido elaborado qualquer estudo sobre as consequências do alargamento para Portugal ou previstos programas que minimizem tais impactos», frisam.
Assim, para além da necessária revisão das perspectivas financeiras, o PCP defende o rompimento com as políticas neoliberais e os seus instrumentos, como é o caso do Pacto de Estabilidade, por forma a assegurar uma política que promova o real desenvolvimento das capacidades produtivas do País.
A ofensiva
dos «grandes»
Em relação aos trabalhos da Convenção (fórum que actualmente prepara o projecto de reforma das instituições europeias a submeter provavelmente ainda este ano à Conferência Intergovernamental), o PCP não tem dúvidas de que se perspectiva «um significativo salto qualitativo na integração federalista, sob o domínio das grandes potências». A demonstrá-lo está mais uma vez o acordo firmado na passada semana entre a Alemanha e a França sobre a futura arquitectura institucional da União Europeia, o qual, afirmam os deputados comunistas, visa «limitar o debate» e assegurar os interesses e o domínio por parte das grandes potências.
De resto, observam, a própria Convenção tem sido dominada pelas forças políticas que até agora dirigiram a integração, sendo disso exemplo o facto de a representação portuguesa estar reduzida a figuras do PSD e do PS. Assim, apesar de algumas contradições, a Convenção avança para a criação de uma «constituição» para a União Europeia, apontando para «uma maior transferência de competências dos estados-membros para a União, para a ampliação da decisão por maioria qualificada e para o reforço das instituições supranacionais da UE, em detrimento da soberania dos Estados e das suas instituições democráticas».
Neste contexto, o PCP considera que o interesse nacional, da democracia e da paz passa pela defesa do direito de veto em questões fundamentais para o país, pela manutenção do comissário, da rotatividade das presidências do Conselho, do peso actual no processo de decisão, bem como pela manutenção do português como língua oficial e de trabalho. Os comunistas estão igualmente contra a transferência de mais competências para a União Europeia ao mesmo tempo que exigem o reforço do papel dos parlamentos nacionais no processo de decisão.
«Estratégia de Lisboa»
Três anos de políticas anti-sociais
Na declaração, Ilda Figueiredo e Joaquim Miranda anunciam a realização, na próxima Primavera, de uma iniciativa sobre a avaliação de três anos após a Cimeira de Lisboa, que contará com deputados do Grupo da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica.
Esta jornada coincidirá com a chamada «Cimeira da Primavera» que irá igualmente debruçar-se sobre os resultados das políticas económicas e sociais, lançadas em Junho 2000 sob a presidência portuguesa, que se propunham atingir, de forma conjugada, mais competividade, mais emprego e mais protecção social.
Porém, como salientam os deputados do PCP no Parlamento Europeu, «desde então, aceleram-se os processos de liberalização e de privatização em sectores fundamentais (de que são exemplo: correios, telecomunicações, energia, transportes, serviços financeiros); caminhou-se para maiores desregulamentações, flexibilização laboral e moderação social; colocaram-se em causa serviços públicos essenciais; deram-se passos para a entrega a lógicas de rentabilização privada dos sistemas de pensões; secundarizaram-se todas as promessas na área social, apesar de se ter lançado a “estratégia de luta contra a pobreza e exclusão social”, de se falar em “pleno emprego”, de “responsabilidade das empresas” e de “desenvolvimento sustentável”.
«Até o princípio inscrito nos tratados da coesão económica e social é cada vez mais esquecido como é notório nas conclusões das recentes cimeiras de Bruxelas e de Copenhaga».