- Nº 1615 (2004/11/11)

A REVOLUÇÃO DE OUTUBRO

Editorial

Em todo o mundo, milhões de pessoas comemoram mais um aniversário da revolução de Outubro, ponto de partida para a primeira grande tentativa de construção de uma sociedade nova, liberta de todas as formas de opressão e de exploração. Por muito forte que seja (e é) e por muito poderosos que sejam (e são) os meios de difusão de que dispõe, a ofensiva de revisão contra-revolucionária da história das revoluções não logrará apagar o impacto e as consequências universais daquele que foi o acontecimento histórico de maior importância, significado e modernidade ocorrido no século passado. As conquistas civilizacionais - políticas, económicas, sociais, culturais – decorrentes da revolução de Outubro, marcam impressivamente o século XX não apenas na pátria de Lénine mas em todos os países do mundo – e é significativo que, 87 anos depois de Outubro, essas conquistas constituam os alvos prioritários da ofensiva da nova ordem imperialista de cariz totalitário e fascizante.
O papel e o exemplo da União Soviética revelaram-se decisivos, em primeiro lugar e desde logo, nos avanços alcançados pelos trabalhadores à escala planetária, ao mesmo tempo que o povo soviético e o seu Exército Vermelho eram os principais protagonistas da derrota do projecto nazi de domínio do mundo – e neste tempo de apagamento e manipulação de memórias, é necessário lembrar que vinte milhões de soviéticos morreram pela liberdade de toda a Humanidade, morreram pela defesa da Paz, morreram a defender a Vida. Decisivo foi, igualmente, o apoio dado pela União Soviética às lutas libertadoras dos povos, o seu papel determinante na liquidação do colonialismo, a sua solidariedade activa no combate a todas as ditaduras fascistas – ditaduras que, recorde-se, tinham nos Estados Unidos da América o seu principal aliado e apoiante.
Em resumo, e com rigor, pode dizer-se que todos os avanços civilizacionais ocorridos no século passado, têm a sua matriz principal nos ideais e na experiência concreta da revolução de Outubro.

Em todo o mundo, milhões de pessoas sofrem, hoje, as consequências do trágico fracasso da experiência iniciada com a revolução de Outubro. Sobre as causas desse fracasso, muito foi dito e escrito, mas certamente muito mais haverá a dizer e a escrever. Sendo certo que a ofensiva permanente e persistente do capitalismo internacional – desencadeada mal a revolução triunfou e prosseguida, de forma intensiva, durante mais de setenta anos – se situa entre os factores relevantes que estiveram na origem desse fracasso, é por de mais evidente o peso determinante de um conjunto de causas internas ligadas quer a graves erros cometidos, quer a práticas de perversão da democracia e de afrontamento e afastamento dos ideais comunistas, quer à acção de dirigentes que, traindo a confiança neles depositada pelo seu partido e pelo seu povo, se passaram com armas e bagagens para o campo inimigo. Importa sublinhar, no entanto, que o balanço negativo não é o dessa primeira tentativa de construção de uma sociedade nova mas sim o do fracasso dessa tentativa.
Observando a situação posterior ao desaparecimento da União Soviética, a grande constatação a fazer é a de que o mundo não é, hoje, nem mais democrático, nem mais livre, nem mais justo, nem mais fraterno, nem mais solidário, nem mais pacífico do que o foi durante essas mais de sete décadas. Bem pelo contrário: o objectivo imperialista de domínio do mundo tem conduzido a trágicos recuos civilizacionais, ao empobrecimento crescente da democracia, a perigosas limitações das liberdades fundamentais, à acentuação da exploração dos trabalhadores, a ataques brutais à soberania e à independência dos povos, a guerras de ocupação à custa de centenas de milhares de vidas humanas – tudo isto camuflado por uma intensa ofensiva ideológica de diabolização do comunismo e de santificação do capitalismo.

Em todo o mundo, milhões de pessoas prosseguem, hoje, a luta pelos ideais da revolução de Outubro. Uma luta que se desenrola em múltiplas frentes e com múltiplos objectivos imediatos mas na qual está sempre presente o sonho milenar de uma sociedade livre, justa, pacífica, solidária e fraterna. Uma luta, sem dúvida travada em condições muito mais difíceis e complexas do que as existentes há duas décadas atrás – quando os trabalhadores e os povos tinham na solidariedade e no apoio da União Soviética um aliado permanente e quando o imperialismo não dispunha da força e da impunidade de que hoje dispõe – e, por isso mesmo, uma luta para travar com a consciência plena dessas dificuldades e, em simultâneo, com a convicção própria de quem sabe estar a bater-se pela mais bela, pela mais justa, pela mais humana de todas as causas. Seria um erro trágico aceitar a ideia da invencibilidade do imperialismo e a sua tese do fim da história. Todos os dias, a vida nos dá exemplos concretos não apenas da necessidade de prosseguir a luta anti-imperialista mas da possibilidade real de suster e, em muitos casos, derrotar a sua ofensiva. Confirmam-no a situação e as lutas dos trabalhadores e dos povos de todo o mundo, de Cuba e da Venezuela ao Iraque e à Palestina, do continente europeu ao africano e ao asiático – lutas que, cada uma com as suas características próprias, lembram, todas, que a revolução de Outubro foi o primeiro passo da mais humana e mais progressista experiência alguma vez tentada e que o fracasso dessa experiência não foi o fracasso dos ideais que a sustentaram, os quais, 87 anos depois, permanecem vivos e actuais.