Domingos Abrantes

A segurança ajudou à fuga

No 45º aniversário da Fuga de Caxias

A «paranóia securitária» que se instalou na cadeia de Caxias após a fuga de Peniche acabou por ajudar à evasão dois oito comunistas ao volante do carro blindado. Quem o afirma é Domingos Abrantes, um dos participantes na fuga.
Para este histórico dirigente do PCP, a grande concentração de comunistas na cadeia – muitos dos quais destacados dirigentes e militantes – e a fuga de Peniche ocorrida no ano anterior precipitou a tomada de medidas por parte da direcção da cadeia. A repressão aumentou e foram introduzidas alterações nas instalações e na vida prisional. É desta altura o portão exterior, que acabaria por ser derrubado na fuga.
Uma das medidas revelou-se desastrosa para os carcereiros, afirmou Domingos Abrantes. «Pegaram nos camaradas responsáveis que estavam disseminados por várias salas e juntaram-nos», afirmou. Esta medida teve um efeito contrário ao que esperavam. Os quadros responsáveis pelas salas aumentaram e os mecanismos de ligação interna aperfeiçoaram-se.
Também a alteração do local do recreio jogou a favor da fuga, recordou o membro do Comité Central. O espaço onde habitualmente os funcionários do Partido tinham o seu recreio foi considerado «pouco seguro» pelos guardas. Foi então que os mudaram para o Fosso Interior, o «mais seguro e o mais interior da cadeia». Ora, destacou Domingos Abrantes, «este era o único sítio onde o carro podia ir. Em boa hora mudaram o local do recreio».
Decidida a fuga com o carro, nascida da ideia do falso «rachado», muitas questões se levantaram. Seria mesmo blindado? Aguentaria o choque do portão? Estaria gente para lá do portão? Que gente? Ponderados os riscos, decidiu-se avançar. No dia da fuga, contou Domingos Abrantes, «vivia-se uma tensão serena». «Não íamos propriamente dar um passeio», notou…

Arriscar a vida e muito mais

A fuga de Caxias «foi um trabalho colectivo», afirmou Domingos Abrantes. Mas dois camaradas tiveram papéis destacados, realçou. Um deles foi António Tereso, que se fez passar por «rachado».
Para Domingos Abrantes, não é possível imaginar o que é «viver longos meses no seio dos carcereiros e dos agentes da PIDE. É uma tarefa difícil e dolorosa». Além do mais, destacou, «poucos camaradas sabiam que o Tereso trabalhava para o Partido e isto significava que ele era hostilizado pelo resto do colectivo partidário e das famílias dos presos».
O dirigente do PCP considera que os sete fugitivos da Sala 2 arriscaram a sua vida na fuga, «mas não mais do que isso». Como funcionários do Partido, tinham o seu futuro traçado. O mesmo não se passava com António Tereso: à beira de sair em liberdade, se a fuga falhasse esperavam-no largos anos de prisão. Se a fuga não se tivesse chegado a realizar – e esteve perto disso – António Tereso sairia em liberdade e viveria com a fama de ter colaborado com a PIDE. «O sucesso da fuga foi também, do ponto de vista humano, uma felicidade», realçou.
O outro foi José Magro. Em primeiro lugar porque «propor a um camarada que se fingisse passar para o campo do inimigo era uma proposta de grande audácia que não se pode separar das características do camarada José Magro», afirmou Domingos Abrantes. José Magro, prosseguiu, «era um camarada corajoso e cheio de iniciativa e tinha ideias muito precisas de que fugir era uma tarefa. Deitava-se a pensar em fugas, levantava-se a pensar em fugas e punha os outros também a pensar nisso».


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