O barulho das luzes

Anabela Fino
A EDP, que até 2010 espera ver os seus lucros crescer a uma taxa de 14 por cento ao ano, vai pedir autorização à Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) para transferir para os consumidores os custos com o novo plano de despedimentos – ou como se diz agora na nomenclatura politicamente correcta «rescisões amigáveis e reformas antecipadas» – que a empresa vai implementar. Em causa, segundo o Diário Económico de 23 de Janeiro, estão 200 milhões de euros para reduzir 660 trabalhadores.
O expediente já foi usado entre 2003 e 2005, com os consumidores a pagar os 482 milhões de euros então gastos com o despedimento de 1420 trabalhadores.
Percebe-se agora melhor o que quis dizer Jorge Vasconcelos, o ex-presidente da ERSE que bateu com a porta, quando na audição na comissão parlamentar de Assuntos Económicos acusou «todos os governos, sem excepção, desde 1997 até hoje, de beneficiarem os produtores de electricidade à custa dos consumidores».
O que pareceu uma contradição, já que Vasconcelos advogava um aumento de 15,7 por cento no tarifário das famílias, pode afinal resumir-se na fórmula «é assim mas podia ser de outro modo se a política fosse outra».
Os benefícios, esses, vão para os suspeitos do costume. E por falar nisso, registe-se que em três anos as 25 sociedades que compõem o universo empresarial do Estado gastaram 5,137 milhões de euros em indemnizações a gestores, conforme noticia o Público (19 de Janeiro) com base num relatório do Tribunal de Contas. Na maioria dos casos a despesa resulta da tradicional «dança de cadeiras» quando muda o Governo, como sucedeu na Caixa Geral de Depósitos com a saída de Mira Amaral e as entradas de Celeste Cardona (CDS-PP) e de Armando Vara (PS).
Mas se há bolsos cheios de milhões, outros há que só conhecem a penúria. É o que se conclui dos dados da Inspecção Geral do Trabalho, que só no ano passado detectou quase 17 milhões de euros de salários, subsídios e prémios em atraso, o que representa um aumento de 62 por cento em relação ao registado em 2005. A subir estão ainda as dívidas à Segurança Social: foram detectados seis milhões de euros em falta, ou seja, mais 30 por cento que no ano anterior.
Com tudo isto não é de admirar que o Instituto Nacional de Estatística venha confirmar o que já todos sabíamos, isto é, que cerca de metade dos trabalhadores por conta de outrem (dois milhões num total de 3,9 milhões) tiveram uma perda real do seu poder de compra em 2006.
É caso para dizer que o reinado de Sócrates está a anos luz das promessas eleitorais.


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