Política do Governo agrava a crise
Apenas se passaram três meses após o início do ano e o Governo já se viu na necessidade de apresentar na Assembleia da República uma proposta de lei que visa alterar o Orçamento do Estado para 2012. Mesmo esta proposta assenta em pressupostos macroeconómicos que já estão ultrapassados.
O Quadro 1, construído com dados constantes da Proposta de Orçamento do Estado para 2012 que foi aprovada, da proposta de Lei que o Governo apresentou na Assembleia da República em Março de 2012, e no Boletim Económico da Primavera de 2012 que o Banco de Portugal acabou de divulgar, mostra a variação verificada nas previsões oficiais em poucos meses, o que revela bem a reduzida credibilidade das mesmas sobre a evolução da situação económica e social em Portugal. A simples comparação dos dados revela, por um lado, a falibilidade das previsões oficiais e, por outro lado, uma tendência nítida de agravamento. No curto período de tempo que decorreu entre a aprovação do OE-2012 e Março de 2012, a quebra no PIB agrava-se entre 17,9% (segundo o Governo) e 21,4% (segundo o Banco de Portugal); no Consumo Privado, que traduz a evolução das condições de vida da população, a redução aumenta entre 20,8% (segundo o Governo) e 52,1% (segundo o Banco de Portugal), etc.. A previsão das exportações, que segundo o Governo são a solução para crise, sofre uma quebra que varia entre 43% e 56%. Portanto, de previsão para previsão, e num curto período de tempo, as previsões do Governo e do Banco de Portugal pioram sempre.
Um aspecto grave são as previsões do Governo sobre a destruição de emprego em Portugal em 2012. Aquando da aprovação do OE-2012, previa-se que seria destruído 1% do emprego, o que correspondia à destruição de 48 370 postos de trabalho. Agora, de acordo com a proposta de OE rectificativo, a destruição atingirá 2,5% (+150%), o que corresponde à destruição de 120 925 empregos. E apesar do Governo afirmar que a taxa média de desemprego em 2012 será de 14,5%, esta previsão parece não ser credível já que, segundo o Eurostat, no 1.º Trimestre de 2012, a taxa de desemprego já tinha atingido em Portugal 14,8%.
Quebra nas receitas com
agravamento da crise económica
Apesar da previsão na quebra da actividade económica do Governo (-3,3% do PIB) ser inferior à já prevista pelo Banco de Portugal (-3,4%), mesmo assim é claro na proposta do 1.º Orçamento do Estado rectificativo para 2012 os efeitos do agravamento da crise económica e social. Segundo esta proposta, o Governo já prevê, relativamente ao que consta do Orçamento do Estado para 2012, uma redução nas receitas do IVA em -239 milhões de euros e de -158 milhões de euros no Imposto sobre veículos, o que soma -309 milhões de euros. E nas contribuições da Segurança Social também uma redução de -182,5 milhões, o que totaliza (impostos e contribuições) já menos 491,5 milhões de euros de receitas para o Estado e para a Segurança Social.
Pagar dívidas à Banca
e a fornecedores do SNS
com fundo de pensões dos bancários
Segundo o OE-2112 rectificativo, 3000 milhões de euros dos fundos de pensões dos trabalhadores bancários que foram transferidos para o Estado serão utilizados para pagar dívidas à banca que tinham as Câmaras, Entidades Públicas (empresas) e entidades do sector de saúde, portanto a banca acaba por receber, desta forma, metade dos fundos que tinha entregue ao Estado a juntar à redução importante de impostos (IRC) que obteve com a mesma transferência. A transferência do fundo de pensões revelou-se, para a banca, um negócio altamente vantajoso pois, para além de ter transferido o elevado risco financeiro que existia no pagamento de pensões aos bancários devido à instabilidade dos mercados financeiros, também lhe permitiu obter elevados benefícios imediatos.
Por outro lado, 1500 milhões de euros do fundo de pensões serão utilizados, segundo o OE rectificativo, para pagar dívidas das entidades do Serviço Nacional de Saúde, agora não em relação à banca, mas sim a fornecedores, nomeadamente a laboratórios (as dívidas actuais do SNS atingem cerca de 3000 milhões de euros, o que determinará que ainda fiquem por pagar mais de 1500 milhões de euros, pelo que a situação do SNS continuará insustentável). Desta forma, 75% dos activos do fundo de pensões dos trabalhadores bancários serão utilizados, não para pagar pensões, como devia acontecer, mas sim em outros fins, ficando o Estado depois com a obrigação de transferir do OE, ou seja, de receitas obtidas de impostos, todos os anos a importância necessária (no OE rectificativo de 2012 consta já uma transferência de 522 milhões de euros com esse fim).
No Orçamento rectificativo existem dois grandes conjuntos de valores que interessa ainda referir pois envolvem também mais responsabilidades para o Estado. São eles os «Passivos Financeiros» e «Activos Financeiros».
Segundo «Economia e Finanças Públicas» de Paulo Trigo Pereira e outros autores, os «Passivos Financeiros», do lado da despesa de Capital, incluem os «pagamentos decorrentes de amortização de empréstimos ou da execução de avales». E de acordo com OE-2012 rectificativo eles somam 1457 milhões de euros destinados à «cobertura de necessidades adicionais de empréstimos bancários de médio e longo prazo», sendo 1100 milhões de euros para a PARVALOREM e PARUPS dois veículos (sociedades) para onde foram transferidos os créditos tóxicos (incobráveis) do BPN antes da sua privatização; 150 milhões de euros para pagar empréstimos da REFER; 90 milhões de euros para a Parque Escolar; 97 milhões de euros para a Estradas de Portugal; e 20 milhões de euros para a Viana Polis.
Os «Activos Financeiros» que, segundo os mesmos autores, incluem a «aquisição de títulos de crédito e a concessão de empréstimos» totalizam, no OE-2012 rectificativo, 6338 milhões de euros, sendo 3000 milhões de euros relativos à aquisição de créditos à banca, referidos anteriormente; 938 milhões de euros para pagar dívidas da RA da Madeira; 135 milhões de euros para dívidas da RA dos Açores; 804 milhões de euros para o Mecanismo Europeu de Estabilidade financeira; 357 milhões de euros para dívidas das Entidades Públicas Reclassificadas; 77 milhões de euros para o QREN, e 27 milhões de euros para Europarques e MARL.
Aumento da dívida pública directa
Contrariamente à mensagem que o Governo PSD/CDS muitas vezes pretende fazer passar junto da opinião pública, a dívida do Estado vai aumentar ainda mais em 2012. Segundo o art.º 2.º da Proposta de Lei 159/2012 de 29.3.2012, que altera o art.º 95.º da Lei do Orçamento do Estado para 2012, o Governo fica autorizado a «aumentar o endividamento líquido global directo até ao montante de 18 910 milhões de euros», quando a Lei do OE-2012 só permitia até 13 890 milhões de euros, ou seja, em mais 5020 milhões de euros. No fim de 2011, de acordo com o Relatório do Orçamento do Estado para 2012, a Dívida Pública Directa do Estado já atingia 17 3131 milhões de euros. Isso significa que, no fim de 2012, a dívida do Estado deverá aumentar, pelo menos, para 19 2041 milhões de euros, o que deverá corresponder a 114,1% do PIB, quando no fim de 2011 correspondia a 101,4% do PIB.
Para terminar interessa ainda chamar a atenção para alguns outros pontos constantes do Orçamento do Estado rectificativo para 2012. Em primeiro lugar, para o reforço das transferências do Estado para os Hospitais EPE em mais 200 milhões de euros, o que é a confissão de que existia um subfinanciamento em relação a estes hospitais, situação esta que Governo e troika estrangeira negavam, e que não será totalmente corrigido com este reforço (entre 2011 e 2012, as transferências do OE para o SNS passam de 8100 milhões de euros para 7525 milhões de euros, segundo a informação que o Ministério da Saúde apresentou à Assembleia da República, aquando do debate do OE-2012, o que significa um corte de 575 milhões de euros). Em segundo lugar, aparece nesta proposta de orçamento rectificativo uma alteração ao Código dos Impostos Especiais de Consumo, que introduz uma taxa de imposto entre 0,50 de euros (mínima) e 1,00 de euros (máxima) sobre a electricidade. Os portugueses, para além de continuarem a pagar as rendas excessivas à EDP, que tardam em serem eliminadas, as quais permitiram a esta empresa obter em 2011 mais de 1100 milhões de euros de lucros líquidos, em que uma parcela vai ser entregue aos novos accionistas chineses sem terem de pagar quaisquer impostos em Portugal, ainda têm de suportar mais este imposto sobre a electricidade, o que é mais um escândalo desta política de austeridade que atinge principalmente trabalhadores e reformados, agravando ainda mais as desigualdades e as dificuldades de milhões de famílias portuguesas. Continuar com esta política de austeridade violenta fortemente recessiva em plena recessão económica, o que contraria os ensinamentos mais elementares da ciência económica, é conduzir a economia portuguesa e a sociedade portuguesa para o abismo.
O ministro das Finanças afirmou, numa entrevista que deu a um jornal, que Portugal estava a atravessar a ponte, no entanto esqueceu-se de dizer o nome de ponte, que era certamente «Entre os Rios» que, quando desmoronou, levou à morte muitos portugueses.