- Nº 2023 (2012/09/6)
Dependência não é inevitável

Aumentar a produção de alimentos

PCP

O combate à dependência alimentar deve ser entendido como um «objectivo estratégico nacional», defendeu o PCP numa conferência de imprensa realizada na segunda-feira.

Como especificou João Frazão, da Comissão Política, este combate passa por um «grande aumento da produção nacional de bens agro-alimentares e pelo controlo adequado das importações, nomeadamente de cereais, componentes para rações e produtos pecuários». Mas passa também, acrescentou, pela baixa do preço dos factores de produção e pelo aumento dos preços na produção sem que isso agrave os preços ao consumidor, pois afectaria sim as margens de lucro dos intermediários. Para o membro da Comissão Política, tais medidas, «sendo inadiáveis, são incompatíveis com o garrote imposto a todas as actividades produtivas pelo pacto de agressão das troikas nacional e estrangeira, que é necessário derrotar».

Para sustentar tal desígnio, defende o PCP, há que promover uma reestruturação agrária que «assegure o cabal e racional aproveitamento económico e social da terra, e o acesso à terra – sobretudo a beneficiada por vultuosos investimentos do Estado, caso de Alqueva e outros regadios – a trabalhadores e pequenos agricultores, sobretudo jovens, que dela carecem para trabalhar e viver com dignidade e que a aproveitarão integralmente para produzir alimentos». A Comissão Política reclama ainda que o Governo assuma, no debate da reforma da Política Agrícola Comum, uma «atitude intransigente na defesa da (re)ligação das ajudas públicas ao rendimento» e no combate à especulação com os preços dos cereais e outros bens agro-alimentares.

Também a manutenção das quotras nacionais de leite não deve ser aceite como uma batalha perdida, acrescentou João Frazão, referindo-se ainda à necessidade de interromper de imediato o aumento anual da quota em um por cento. A não ser assim, alertou, o mercado português será encharcado com a produção de países que «já hoje têm excedentes», podendo-se pôr em risco, «definitiva e irreversivelmente, a produção leiteira em Portugal». O PCP exige ainda a prestação célere de apoios aos agricultores afectados pelas intempéries ou outras dificuldades imprevistas.

A culpa não é da seca

Não desprezando o papel da seca prolongada na quebra verificada na produção de cereais, João Frazão lembrou que esta quebra vem já de trás: em 2008, por exemplo, Portugal importou 62 por cento do milho, 87 por cento do trigo rijo e 96 por cento do trigo mole que consumiu. Sem seca.

A produção nacional em cereais, precisou o dirigente do Partido, assegura apenas perto de 20 por cento das necessidades actuais do País, mesmo tendo em conta a redução do efectivo pecuário e a contracção do mercado interno. Este défice na produção cerealífera (e pecuária) reflecte-se de forma brutal no défice da balança comercial em bens agro-alimentares, que se aproxima dos quatro mil milhões de euros por ano.

Após realçar que esta situação tem «causas e responsáveis», João Frazão enumerou algumas: as revisões da PAC em que se permitiu aos latifundiários e a grandes empresas receberem «rios de dinheiro» sem estarem obrigados a produzir ou a criminosa política de ocupação de terras agrícolas para produção de matérias-primas (ou mesmo o uso do milho para o fabrico de biocombustíveis). O Governo prepara-se ainda para abrir os regadios ao plantio de eucalipto em vez de fomentar o cultivo de cereais, em mais uma medida de favorecimento das multinacionais da celulose.

Como lembrou João Frazão, os cereais sofreram um aumento de 17 por cento de Junho para Julho, e novos aumentos são esperados. Enquanto isso, a especulação com os preços dos cereais, expressa no Mercado de Futuros da Bolsa de Chicago, regista «lucros escandalosos e desumanos». A fome é a outra face da moeda.