A porta giratória

Filipe Diniz

É mais do que sabido o conceito da «porta giratória» entre cargos governativos e cargos na administração de grandes empresas: governantes que, acabado o seu mandato público, de repente se vê em lugares chorudamente pagos em empresas privadas. E não é raro que se trate de empresas com quem, enquanto governantes, tinham anteriormente estabelecido vultuosos contratos e negócios.

Há naturalmente excepções, como a da multinacional farmacêutica que descobriu em José Sócrates insuspeitos dotes para o seu ramo e o contratou, encarregando o «filósofo»/farmacêutico de uma qualquer tarefa de influência, bem paga como ele merece.

E há outros casos, como o do trânsito de Jorge Coelho de responsável pelas Obras Públicas no governo de Guterres para a presidência da Mota-Engil, que fora – ela ou empresas e consórcios em que participa – não pouco beneficiada nos negócios durante a sua gestão ministerial. Ele foram as milionárias concessões rodoviárias, ele foram as SCUT, ele foi o 2.º acordo com a Lusoponte, ele foi o prolongamento do prazo da concessão do maior terminal de contentores do Porto de Lisboa, entre outros.

E agora que informam os jornais? Que Jorge Coelho abandona a presidência da Mota-Engil e «regressa à política». Dar-se-á o caso de estarmos perante uma nova rotação da «porta giratória»? É que, por curiosa coincidência, há bem pouco o Governo anunciou o «plano de reestruturação» do Porto de Lisboa, envolvendo um investimento total de 1050 milhões de euros. Plano que envolve a monstruosa e irracional construção de um terminal de contentores na Trafaria e um novo golpe em Lisboa enquanto cidade portuária, mas que foi calorosamente aplaudido por António Costa, que desconhece o papel central que a actividade portuária representa na história e na identidade da cidade. E mais: terminal que envolverá direitos anteriormente cedidos à Liscont, em que a Mota-Engil participa.

Pode tratar-se de uma simples coincidência. Mas também não custa imaginar nesta movimentação a Mota-Engil a chegar-se à frente. O País afunda-se na recessão e o povo na miséria. Mas enquanto houver algum osso para roer os abutres mantêm-se a postos, empoleirados sobre os partidos da «alternância».



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