O atentismo

Manuel Gouveia

Diz-se atentismo quando aqueles que deveriam impulsionar a transformação ficam à espera de que essa transformação aconteça sem eles próprios se envolverem, e quando esse próprio envolvimento é condição para que a transformação se dê. O atentismo é uma forma de idealismo, logo, é anti-marxista.

Na situação que vivemos hoje, com a alteração na correlação de forças que de facto aconteceu no dia 4 de Outubro, é possível avançar, reconquistar pedaços do que foi roubado ao povo e aos trabalhadores nos últimos anos, travar ofensivas em curso e até lançar uma ou outra contra-ofensiva. Mas só é possível avançar na exacta medida em que essa correlação de forças se alterou, (e ela não se alterou assim tão significativamente) e construindo novas e positivas alterações na correlação de forças, e particularmente na mais decisiva de todas as suas componentes, a confiança, perspectiva e disponibilidade para a luta das trabalhadores.

É certo que os reformados do Metro têm agora melhores condições para recuperar os complementes de reforma, mas só os recuperarão se se lançarem à luta em vez de ficarem à espera que a maioria de deputados cumpra com as suas promessas. Os processos de privatização da TAP, do Metro de Lisboa, da Carris e dos STCP podem agora ser travados e revertidos por uma maioria de deputados eleitos na Assembleia da República cujos partidos assumiram esse compromisso, mas tal só acontecerá se os trabalhadores dessas empresas e o povo português em geral incrementarem a mobilização para exigi-lo. Os trabalhadores vítimas dos roubos de salários e anuidades, e os trabalhadores vítimas do saque fiscal sobre o trabalho têm agora melhores condições de impedir a continuação desses roubos e determinar mais do próximo Orçamento do Estado, mas tal só acontecerá se se unirem e avançarem decididos para a luta.

Uns e outros, se ficarem à espera seja do que for, de um «governo de esquerda», de um «grupo técnico» ou de «acordos parlamentares», verão frustradas as suas expectativas, pois só é possível avançar se o processo pelo qual esse avanço se der criar ele próprio novas e positivas alterações na correlação de forças.




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