de Álvaro Cunhal evocado no Porto
Obreiro e construtor da unidade
Mais de 200 pessoas participaram, no dia 10, na evocação de Álvaro Cunhal por ocasião do seu 103.º aniversário, realizada na Fundação Eng. António de Almeida, no Porto. De entre as múltiplas vertentes desta personalidade fascinante e multifacetada, o PCP optou por destacar o seu contributo teórico e prático sobre a unidade – do Partido, dos trabalhadores e destes com outras classes e camadas sociais –, questão decisiva para a luta dos comunistas.
As reflexões de Álvaro Cunhal sobre a unidade mantêm-se actuais
No processo de luta pela política patriótica e de esquerda por que se bate, o PCP sublinha como condição decisiva para a sua concretização o alargamento da convergência e unidade dos democratas e patriotas – a par do desenvolvimento e intensificação da luta de massas e do reforço do Partido a todos os níveis. Também para alcançar a Democracia Avançada, o Programa do Partido aponta esta como uma questão essencial.
Na intervenção que proferiu na sessão evocativa de dia 10, a última da tarde, Jerónimo de Sousa realçou que a alternativa patriótica e de esquerda «será expressão e surgirá da confluência da acção, intervenção convergente das organizações e movimentos de massas dos trabalhadores e camadas antimonopolistas, de personalidades e sectores democráticos». Garantindo o empenhamento do PCP na concretização deste objectivo, o Secretário-geral revelou que os comunistas trabalham para «unir na luta as diversas classes e camadas antimonopolistas pelas suas aspirações e direitos, pelo reforço das suas organizações e movimentos unitários, e da sua intervenção em defesa dos seus interesses específicos».
Esta unidade e esta convergência, realçou ainda Jerónimo de Sousa, tem como «condição primeira a própria unidade da classe operária», construída na luta pelos seus interesses concretos e imediatos. Ela é a base para uma mais vasta unidade.
Reflexão e prática
Mas que tem isto a ver com Álvaro Cunhal, questionará o leitor? Tudo, respondemos, pois na profícua e profunda obra política de Álvaro Cunhal e na sua acção como militante e dirigente comunista a unidade foi sempre uma das suas preocupações centrais. Disto falaram não só Jerónimo de Sousa, mas também o director das Edições Avante!, Francisco Melo, o sindicalista João Torres e o historiador Manuel Loff.
Nas quatro intervenções, reflectiu-se sobre a política de alianças do Partido da classe operária nas várias etapas e fases da luta revolucionária, das alianças estratégicas e tácticas – as primeiras não podem ser postas em causa pelas segundas, da mesma forma que não devem ser invocadas como «impeditivas de alianças tácticas», como realçou Francisco Melo –, de alianças sociais e da sua (mais difícil) expressão política, das várias formas que a unidade assumiu ao longo dos 95 anos do PCP e da unidade dos trabalhadores, consagrada na concepção da «frente única operária», que Álvaro Cunhal tanto contribuiu para que fosse aplicada à realidade concreta do País.
Francisco Melo e Jerónimo de Sousa realçaram ainda a reflexão de Álvaro Cunhal – e do PCP – acerca de outra questão decisiva, a soberania nacional, também ela potencialmente promotora de largas alianças sociais e políticas.
Arte para um artista
Apresentada por Teresa Lopes, da Direcção da Organização Regional do Porto do PCP, a sessão evocativa contou ainda com um momento musical a cargo do pianista Fausto Neves, que acabou por chamar a atenção para outra vertente de Álvaro Cunhal, a de pensador sobre arte e estética e ele próprio um criador, nomeadamente nos campos do desenho, da pintura e da literatura.
Uma das peças interpretadas pelo músico foi a última composição de Fernando Lopes-Graça, a Memória Festiva n.º 23, oferecida ao «grande camarada e amigo Álvaro Cunhal» por ocasião do seu 80.º aniversário. A 19.ª Visão Fugitiva, de Prokofiev, escrita em 1917 e inspirada numa situação perigosa em que o compositor se viu envolvido durante a Revolução de Fevereiro, foi outra das peças tocadas por Fausto Neves.
Ensinamentos que perduram
O papel decisivo de Álvaro Cunhal para a construção do movimento sindical unitário foi destacado por João Torres, sindicalista e membro do Comité Central. Recordando o contributo ímpar dado por Álvaro Cunhal para a «acção e intervenção dos comunistas no movimento operário e sindical», João Torres lembrou ainda as reflexões e teses por ele desenvolvidas e que «em grande medida enformam a CGTP-IN, defendendo um movimento sindical de classe e características únicas para a acção, designadamente a unidade de todos os trabalhadores, o funcionamento democrático, a solidariedade, a independência face a partidos políticos, credos e religiões e o sindicalismo de massas».
Sendo a luta da classe operária «determinante para a transformação social», lembrou o sindicalista, Álvaro Cunhal apontava a unidade de todos os trabalhadores como factor decisivo para a construção de um «movimento sindical unificado à escala nacional». A ideia defendida por alguns de se criar um «movimento sindical comunista» foi por ele sempre fortemente combatida.
Manuel Loff, que subiu à tribuna levando consigo um exemplar do ensaio de Álvaro Cunhal, Rumo à Vitória, de 1964, lembrou os principais momentos em que, durante o fascismo, foi possível alcançar uma ampla unidade antifascista: a Frente Popular Portuguesa, entre 1936 e 1937; o Movimento Nacional de Unidade Antifascista, criado em 1943; o Movimento de Unidade Democrática, que surgiu em 1945; o Movimento Nacional Democrático, que nasceu das ruínas da candidatura presidencial de Norton de Matos e resistiu até à prisão dos seus principais dirigentes, em 1954; a fusão das candidaturas de Arlindo Vicente e Humberto Delgado, entre 1957 e 1958; e a CDE, que teve um importante papel nos derradeiros anos do fascismo.
O historiador recordou ainda a resposta dada por Álvaro Cunhal aos que defendem que primeiro se chegue a um «acordo em tudo» e só depois se constitua as respectivas frentes unitárias. O que a experiência então – como hoje – mostrava é que «se se fica esperando acordo em tudo para depois se começar a marchar em comum, nunca mais se marcha». É a unidade e a acção conjunta que, por outro lado, aproxima pontos de vista e favorece uma melhor definição do movimento unitário.