Das cinzas

Os recentes incêndios dominaram (e bem) a agenda mediática dos últimos dias. Não que toda a cobertura jornalística tenha andado bem.

Ao caso que causou maior escândalo, da reportagem televisiva em directo com uma jornalista ao lado de um corpo carbonizado, que já motivou um processo aberto pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social, há muitos outros exemplos de violação ao Código Deontológico:

«7. O jornalista (...) deve proibir-se de humilhar as pessoas ou perturbar a sua dor. (…)

9. O jornalista deve respeitar a privacidade dos cidadãos excepto quando estiver em causa o interesse público (…). Obriga-se, antes de recolher declarações e imagens, a atender às condições de serenidade, liberdade e responsabilidade das pessoas envolvidas.»

Foram repetidas imagens, seja em televisões, jornais e na Internet, de corpos carbonizados cobertos por lençóis, de entrevistas a quem, no momento, corria perigo de vida, procurava socorrer familiares, amigos, bens e propriedades ou perdeu familiares nos momentos anteriores.

A transformação de um acontecimento dramático num espectáculo foi, com excepções, a regra da comunicação social dominante. Como fizeram no passado com afogamentos, desastres rodoviários ou outros acidentes ou catástrofes naturais. Quando as chamas se extinguirem e o pano cair, também os que ontem se aproveitaram de populações ainda em choque seguirão o próximo drama que lhes garanta vendas.

Não houve respeito pela dor dos que perderam familiares e amigos, muito menos pelas «condições de serenidade, liberdade e responsabilidade das pessoas envolvidas».

Estes mesmos que, agora, violam as suas obrigações deontológicas, são os mesmos que, no passado, se demitiram do seu papel social: informar. Os incêndios repetem-se, com maior ou menos intensidade, a cada Verão; mas é raro vermos, ouvirmos ou lermos sobre as causas e as medidas necessárias à sua prevenção fora da época estival. Será que ninguém quer saber? Será que «os políticos» só se preocupam com a floresta quando está a arder?

A 21 de Fevereiro, numa visita ao baldio de Vilarinho (Lousã), o Secretário-geral do PCP alertava: «É fora da época de incêndios que se deve discutir esta temática.» Para além da Lusa, só a RTP esteve e decidiu passar a resposta a uma pergunta sobre a comissão de inquérito da Caixa.

Mas este não é caso único, as declarações sobre política florestal pelo PCP são várias ao longo dos últimos anos. No Dia Mundial da Floresta de 2014, Jerónimo de Sousa fez uma conferência de imprensa sobre o tema. Passado um ano, foram os deputados do PCP no Parlamento Europeu que realizaram uma audição sobre a floresta e, em Novembro de 2016, sobre a Política Agrícola Comum. Já este ano, em Janeiro, João Frazão fez uma conferência de imprensa sobre o pacote florestal em consulta pública, na altura, e, em Abril, o deputado João Ramos fez duas intervenções sobre política florestal no Parlamento. A estas, somam-se declarações a cada época de incêndios.

De todas estas iniciativas e intervenções – quando era altura de tomar medidas para atacar os problemas que o PCP vem denunciando –, pouco ou nada foi noticiado. E quando se fala da responsabilidade da «classe política» como se de um todo se tratasse, mais uma vez impõe-se dizer: não são todos iguais.




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