Escravos e indignação

Ângelo Alves

A divulgação de imagens de um mercado de escravos nos arredores de Tripoli, capital da Líbia, chocou muita gente, incluindo o secretário-geral da ONU que se mostrou «horrorizado». É mais do que justa a indignação, e no caso do secretário-geral da ONU é inclusive uma obrigação. Mas não chega. Não basta afirmar que «a escravatura não tem espaço no nosso mundo». É necessário ir às causas, e elas são essencialmente duas.

A primeira é o capitalismo e as formas de exploração e opressão que aprofunda no seu desenvolvimento. Vários estudos indicam que a escravatura e o tráfico de seres humanos tem vindo a aumentar nas últimas duas décadas e meia. Um estudo elaborado em 2016 aponta a existência de 40 milhões de escravos no Mundo, número que está muito abaixo daquilo que será a realidade. Trabalho forçado (que alimenta os lucros de grandes multinacionais em variados continentes) e prostituição são os dois maiores «destinos» dos escravos dos tempos modernos, do quais um quarto são crianças e a esmagadora maioria (71%) mulheres.

A segunda causa decorre da política imperialista de guerra e recolonização imperialista. As intervenções imperialistas no Norte de África e Médio Oriente causaram um aumento exponencial do movimento de refugiados e migrantes. A resposta xenófoba e militarista da União Europeia escancarou as portas às migrações clandestinas, pasto para os traficantes de seres humanos e para o florescente mercado de escravos que está longe de se confinar à Líbia. Basta por exemplo reter que em 20 dos 27 países da União Europeia o risco de escravatura tem vindo a aumentar.

Ou seja, a indignação de Guterres deveria estender-se às decisões do próprio Conselho de Segurança da ONU, que patrocinou a destruição de países inteiros, como a Líbia, onde agora se vende escravos a 338 euros a cabeça e onde há dez anos a sua população gozava de um dos maiores índices de desenvolvimento humano de todo o continente africano.




Mais artigos de: Opinião

Não ao militarismo!

A denominada «cooperação estruturada permanente» da União Europeia (UE) no domínio militar, cuja adopção está prevista para 11 de Dezembro, constitui um significativo salto no aprofundamento da militarização da UE – um processo que tem...

Foi uma vitória, sim!

O pagamento do subsídio de Natal em duodécimos introduzido durante o governo PSD/CDS visou atingir dois objectivos. Primeiro, no imediato, era disfarçar os cortes nos salários e reformas que estavam a ser impostos, tornando menos perceptível a brutalidade dessas decisões....

Desbaratar

Há por aí quem diga que «os portugueses vivem acima das possibilidades», ou que sobre o OE para 2018: «trata-se de não desbaratar aquilo que deu tanto trabalho aos portugueses». A tese, brilhantemente vendida nesta síntese, é a de «andámos» os...

Prioridade à intervenção nas empresas

A organização do Partido nas empresas e locais de trabalho é essencial para um partido comunista, pois fixa a sua natureza de classe enquanto partido da classe operária e de todos os trabalhadores.

Deslocalizações

Há cerca de uma semana, a 21 de Novembro, o País soube pela comunicação social que o Infarmed ia ser deslocalizado para o Porto. Mas não foi apenas o País que o soube nessa altura, o próprio Infarmed também ficou informado na mesma ocasião, como garante a sua...