Na cova dos leões

Correia da Fonseca

Chegou o «Prós e Contras» na passada segunda-feira, a ordem de trabalhos era o linchamento público da Venezuela chavista, a equipa de executores era abundante e contava com presenças ilustres. Não parece absurdo, portanto, que nessas circunstâncias tenha acontecido a alguns telespectadores, ao depararem com António Filipe como que cercado por tantas e tão qualificadas figuras, lembrarem-se do episódio bíblico de Daniel na cova dos leões. É certo que, decorrido algum tempo e ouvidas as diversas intervenções, ficou claro que o deputado comunista não seria devorado ali mesmo, bem pelo contrário, e que se salvaria mesmo sem intervenção divina: acontece que ter razão e saber expô-la quase sempre protege tanto ou mais quanto um apoio sobrenatural. Ora, ainda que em poucas palavras, António Filipe referiu o essencial: enumerou o intenso bombardeamento por boicotes e sanções, denunciou a intensa ofensiva mediática e o cerco financeiro/económico, recuou no tempo para lembrar o significativo antecedente que foi o falhado golpe militar durante o qual Hugo Chavez chegou a estar detido durante algumas horas pelos golpistas «inspirados» pelos Estados Unidos. A reforçar as intervenções dos convidados a pronunciarem-se ali, no auditório do Centro Champalimaud onde o programa ia acontecendo, estiveram as gravações dos recados dos agentes da própria RTP viajados para Caracas, e assim se reforçou a informação de que a revolução chavista prosseguida por Maduro está liquidada.

Ganhar ou comprar «a rua»

Informação interessante foi a produzida pelo eurodeputado Francisco de Assis, socialista e portanto homem de esquerda, o que bem se notou pela gravata vermelha que o decorava. Afirmou Assis que «Maduro já perdeu a rua». Contra esta sentença, porém, e de facto desmentindo-a, têm vindo a depor as imagens transmitidas pela própria RTP de grandes manifestações populares de apoio ao chavismo em geral e a Maduro em particular. Também temos podido ver, é certo, grandes manifestações contra o governo, mas bem se sabe que isso de grandes manifestações é coisa fácil de comprar desde que se disponha de dinheiros abundantes, designadamente de dólares, argumento que não parece estar ao dispor de Maduro, e aliás questão útil seria a de saber qual é a actual cotação em dólares USA de cada dúzia de manifestantes anti-Maduro nas ruas de Caracas. Entretanto, foram transmitidos alguns depoimentos certamente recolhidos com exigente critério, incluindo a de um decerto santo sacerdote que se juntou aos críticos de Maduro. Curiosamente ou talvez não, foram escassas as palavras de apoio ao autopresidenciado Guaidó. Como se a aposta no «presidente» que o governo português se apressou a reconhecer fosse pouco promissora. O que naturalmente poderemos saber nos próximos episódios desta novela que ameaça poder tornar-se dramática.




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