Sem remédio
A notícia sobre a bebé com uma doença rara que necessita de um medicamento só existente nos EUA teve honras de primeira página na generalidade dos media o tempo suficiente para que se explorasse o assunto sob a capa sempre oportuna da preocupação humanitária.
Não se tratou de resolver qualquer problema, embora o referido medicamento seja comercializado pela empresa norte-americana que detém o registo da patente pelo preço obsceno de dois milhões de dólares. Segundo o que veio a público, os pais da bebé já tinham conseguido angariar a astronómica verba graças à solidariedade nacional, pelo que o destaque dado à história visou essencialmente questionar a propósito o Ministério da Saúde e o Infarmed.
Tendo-se apurado que aquelas entidades desconheciam o caso; esclarecido que foi qual o procedimento a ser seguido para a obtenção do medicamento, ao que parece ainda não homologado pela Agência Europeia de Medicamentos; e assumida pelo Estado a responsabilidade de o disponibilizar através do Serviço Nacional de Saúde, o interesse mediático esmoreceu.
As questões da saúde continuam na ordem do dia, evidentemente, mas delas não faz parte o que devia ser elementar e este caso veio uma vez mais evidenciar: a condenação sem contemplações de um sistema que permite que a saúde, seja de um bebé ou de qualquer ser humano, esteja sujeita à exploração de empresas sem escrúpulos.
O que está em causa no caso das bebés Matilde não é saber se o SNS paga ou não o medicamento de que necessitam. O que está em causa é saber se queremos a saúde dependente da ganância, da agiotagem, da extorção do capital.
A resposta a esta questão devia orientar o debate, se o debate fosse sério, sobre o SNS. Não é o caso.