Inquisidores

Manuel Rodrigues

O recém-nomeado presidente da Fundação Nacional de Artes do Brasil (Funarte), o principal órgão público que fomenta as artes no país, afirmou no seu canal no Youtube que «o Rock leva ao aborto e ao satanismo». Dante Mantovani, de seu nome, terá declarado que «o rock activa a droga, o sexo e a indústria do aborto». E, para que não restassem dúvidas, rematou: «a indústria do aborto, por sua vez, alimenta uma coisa muito mais pesada que é o satanismo. O próprio John Lennon disse que fez um pacto com o diabo».

E para que ficasse claro o quadro ideológico em que passará a dirigir a Funarte, bolsou ainda: «agentes comunistas infiltrados na CIA [Agência Central de Inteligência norte-americana] foram responsáveis por distribuir LSD [substância alucinogénea] a jovens durante o festival de Woodstock».

Por sua vez, o novo presidente da Fundação Cultural Palmares (instituição que tem como missão apoiar a cidadania, identidade, acção e memória dos segmentos étnicos dos grupos formadores da sociedade brasileira), Sérgio de Nascimento Camargo, sobre o racismo, fez esta afirmação absolutamente grotesca: «O Brasil tem racismo “nutella”. Racismo real existe nos EUA. A “negrada” daqui reclama porque é imbecil e desinformada pela esquerda».

E porque, como diz o povo, não há duas sem três, o director do Centro de Artes Cénicas da Funarte, Fernando Alvim, apelidou Fernanda Montenegro, conceituada actriz brasileira, de «sórdida» por «deturpar os valores mais nobres da civilização, denegrindo a sagrada herança judaico-cristã».

Não fosse a resistência do povo brasileiro e das suas organizações progressistas, mais uma vez apostadas em derrotar a barbárie que tomou conta do Brasil, e, em vez de cultura, poderíamos antever inquisidores, autos de fé, fogueiras e a idade das trevas a dominar aquele País.




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