Duas vitórias

Ângelo Alves

A Bolívia e o Chile mostram que é possível resistir e avançar

A realização das eleições na Bolívia e o Referendo constitucional no Chile constituem dois importantes acontecimentos na evolução da situação na América Latina, que se somam a outros importantes focos de resistência no caminho de luta dos povos daquela região.

Na Bolívia, o povo saiu à rua em massa para comemorar a retumbante vitória do Movimiento Al Socialismo (MAS) nas eleições de 18 de Outubro. Com uma impressionante participação de 88,4%, os bolivianos atribuíram ao MAS uma vitória historicamente expressiva – nunca uma força política tinha tido tantos votos em toda a história da Bolívia, 3,4 milhões de votos. Luis Arce foi eleito Presidente da Bolívia à primeira volta com 55,1% dos votos e o MAS consegue resultados de 60% e 58% nas votações para a Câmara de Deputados e para o Senado, respectivamente.

Apesar da COVID-19, e de inúmeras manobras das forças golpistas para tentar condicionar as eleições e manter o poder, as forças progressistas, o movimento sindical e outros movimentos sociais da Bolívia levaram a sua resistência de um ano até às urnas de voto e demonstraram de uma forma extraordinária que o que aconteceu na Bolívia em Outubro de 2019 foi um golpe de Estado, um crime contra a democracia, a vontade popular e a Constituição. Um golpe inserido na agenda golpista do imperialismo, ao serviço do grande capital que saliva pelos recursos naturais da Bolívia, apoiado e desencadeado por forças externas, com um papel vergonhoso da OEA e do agente de serviço Luis Almagro.

No Chile, gigantescas multidões encheram a rebaptizada Praça da Dignidade (antiga Praça Itália) e as ruas e avenidas de Santiago do Chile para comemorar a vitória no referendo para um nova Constituição. As canções de Victor Jara e o grito o povo unido jamais será vencido ecoadas mais uma vez ilustraram bem o significado histórico e político da vitória esmagadora do «Sim» a uma nova Constituição que irá pôr fim à actual, herdada da ditadura fascista de Pinochet, concebida para eternizar um regime ultraliberal, peça exemplar da Escola de Chicago, que está na origem das enormes desigualdades sociais e da corrupção naquele País.

Apesar da criminosa repressão do Governo de Sebastian Piñera o povo chileno conseguiu vencer a violência, ultrapassar manobras de divisão do movimento social e político e evoluir de uma contestação contra desigualdades e problemas sociais para um patamar de luta que pôs em causa a «espinha dorsal» de um regime que nunca rompeu de facto com a ditadura de Pinochet. As percentagens de 78,2% para o «Sim» e de 79,2% para a opção de a nova Constituição ser redigida por uma Convenção Constituinte eleita directamente pelo povo, ilustram bem a opção de romper com o passado ditatorial e abrir um novo caminho de esperança e progresso. Segue-se agora um período altamente exigente do ponto de vista político em que tudo será tentado para quebrar a unidade popular e perverter o carácter abertamente progressista desta conquista.

Não obstante o imperialismo já ter demonstrado capacidade de usar de muitos meios e tácticas para tentar impedir a emancipação social e nacional dos povos daquela região, estes dois acontecimentos são duas importantes vitórias nas muitas batalhas que se estão a travar na América Latina e demonstram que é possível resistir e avançar!




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