Eleições em África e ingerências
Na República da Guiné, a violência pós-eleitoral provocou mais de duas dezenas de mortos. Após o anúncio dos resultados pela Comissão Eleitoral Nacional Independente – o presidente Alpha Condé, eleito em 2010 e reeleito em 2015, venceu agora com 59,5% dos votos –, começaram os distúrbios, em Conakry e noutras regiões. O segundo candidato mais votado, Cellou Diallo, que obteve 33,5% dos votos nas eleições de 18 de Outubro, rejeitou os resultados, disse que o escrutínio foi manchado por irregularidades.
Este é um exemplo recente de violência em processos eleitorais em África, em geral contestados por forças políticas perdedoras. Como tem acontecido, aliás, em outras paragens, da Europa à América.
No caso da Guiné, é também mais uma ingerência de potências ocidentais em assuntos internos dos países africanos: a França, a União Europeia e os Estados Unidos não se coibiram de tomar partido e «questionaram» a credibilidade dos resultados oficiais.
Na vizinha Costa do Marfim, um conflito semelhante: a proclamação da vitória de presidente Alassane Ouattara nas eleições de 31 de Outubro, para um terceiro mandato, causou distúrbios em Abidjan, com uma dezena de mortes. A votação foi boicotada pela oposição, que considera inconstitucional a candidatura de Ouattara, fiel aliado da França, eleito em 2010 e 2015 com o apoio de Paris.
Também na Tanzânia os resultados das eleições presidenciais e legislativas, de 28 do mês passado, provocaram interferências estrangeiras. O presidente John Magufuli foi reeleito para um segundo mandato com mais de 84% e o seu partido, o Chama Cha Mapinduzi, conquistou a maioria absoluta dos assentos parlamentares. O principal opositor, Tundu Lissu, obteve 13% dos votos mas, sem provas, considerou «ilegítimos» os resultados oficiais eleitorais.
Os EUA resolveram de igual modo interferir no processo eleitoral tanzaniano e, sem pudor, o Departamento de Estado expressou «profunda preocupação» com «relatos credíveis de irregularidades significativas». Ameaçou mesmo «considerar acções» para responsabilizar «violações dos direitos humanos» no país leste-africano.
As ingerências norte-americanas e europeias sucedem-se em África (como em outros continentes…) mesmo sem o pretexto de eleições.
No Mali, depois do golpe de Estado militar de Agosto e da instalação de autoridades encarregadas de dirigir a transição do país – muito pela mediação da União Africana e da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental –, a presença de tropas estrangeiras mantém-se e a guerra prossegue.
A ministra das Forças Armadas de França, Florence Parly, anunciou na segunda-feira, 2, que uma operação levada a cabo no Mali, junto à fronteira com o Burkina Faso e o Níger, tinha «neutralizado» mais de 50 jihadistas ligados ao grupo Ansarul Islam, associado à Al-Qaida. A acção foi levada acabo por forças especiais francesas da Operação Barkhane, que intervém com mais de cinco mil efectivos no Mali e em outros países do Sahel.
Mais um exemplo da permanente ingerência imperial em África, neste caso descarada, é o que se passa no Sudão. Washington prometeu retirar Cartum da «lista negra» dos países que «apoiam o terrorismo» e levantar as sanções económicas – mas impôs como moeda de troca o reconhecimento de Israel pelo governo sudanês…