Capital levado ao colo
Tecla muito batida pelo Governo e sua maioria foi a da alegada equidade fiscal do OE e subsequente ideia de que os sacrifícios tocam a todos. Uma redonda mentira, como os deputados comunistas trataram de demonstrar em vários ocasiões ao longo do processo de aprovação do documento.
SGPS beneficiam de privilégios escandalosos
No último dia do debate em plenário, já perto da votação final global, também por sua iniciativa, o tema voltou a saltar para primeiro plano, a propósito do que o deputado comunista Honório Novo designou por «sigla mágica» deste OE e que dá pelo nome de SGPS – Sociedades Gestoras de Participações Sociais.
Enumerando algumas delas, citou a ZON, a SEMAPA, a CIMPOR, o BCP, o BES, a Soares da Costa, a SONAE, a Jerónimo Martins, etc., etc., SGPS cujas sedes, assinalou, «ao contrário do que o povo português julga, não estão em Portugal, estão em zonas, regiões ou países com regimes fiscais privilegiados».
Mas o que o parlamentar do PCP quis sublinhar foi o facto de no OE não existir «uma única medida, uma única norma» que penalize estas entidades em IRC. Pelo contrário, acusou, o que há «são novas normas para alargar o regime dos benefícios fiscais de que as SGPS beneficiam, já beneficiavam, e que vão continuar a beneficiar».
Foi a ausência de qualquer medida no sentido de pôr cobro a esta iniquidade, aliás, que levou o PCP a avocar a plenário a sua proposta de tributar as mais-valias mobiliárias das SGPS em IRC.
Uma proposta que a maioria chumbou, levando o PCP a concluir, por conseguinte, que ficara reduzido a pó o argumento tantas vezes aduzido por PSD e CDS de que haveria equidade fiscal neste OE e que os sacrifícios estariam a ser distribuídos por todos.
«Pode o secretário de Estado dos Assuntos Ficais falar em “ética na equidade fiscal”, pode o ministro das Finanças, o primeiro-ministro e todos os ministros em coro falar de distribuição de sacrifícios por todos os portugueses, que ninguém acredita nisso», sustentou Honório Novo, vendo na acção do Governo um objectivo central: «submeter o País aos interesses e às imposições estrangeiras através do pacto de agressão, explorar ainda mais quem trabalha, empobrecer o País».
Roubar ao povo
Sintomática foi, entretanto, a reacção protagonizada pelo deputado do PSD Paulo Baptista Santos que, perante as afirmações da bancada comunista, acabou na prática por assumir-se como verdadeiro porta-voz dos interesses das SGPS ao afirmar que estas e seus accionistas já são devidamente tributados em sede de IRC e IRS.
A réplica não tardou, com o líder parlamentar do PCP, Bernardino Soares, a considerar que «este OE o que faz é roubar aos trabalhadores e reformados e meter o dinheiro no bolso do grande capital e dos grupos económicos».
E é por essa razão, concluiu, que o PSD e o CDS não querem tributar as SGPS como devem ser tributadas. «Os senhores são coniventes com isso», acusou, observando que «depois de três dias de debate em que os deputados da maioria passaram a vida a dizer que não há dinheiro para a Educação, que não há dinheiro para a Saúde, que não há dinheiro para os salários, mas para meter no bolso desta gente que espolia o País de recursos e riqueza há sempre dinheiro».
E a melhor prova de que assim é, acrescentou ainda, está no decreto-lei sobre as taxas moderadoras publicado no dia que antecedeu a aprovação do OE, no qual o Governo determina um aumento das mesmas para o dobro.
«Enquanto a SONAE, a PT, os grandes grupos económicos passam sem pagar imposto, os portugueses pagam o dobro de taxas moderadoras, já de si muito elevadas porque o PS sucessivamente as aumentou», observou Bernardino Soares, para quem esta é a «moralidade» da maioria.
Acusou ainda a proposta de ter uma cláusula (que sujeita à condição de recursos a comparticipação nos medicamentos), a qual, do seu ponto de vista, significa a exclusão de centenas de milhares de portugueses no acesso aos seus direitos, o mesmo é dizer que muitos reformados não vão conseguir ter acesso à comparticipação dos medicamentos e passarão a pagá-los por inteiro.
«É isto a política do OE: roubar aos trabalhadores e ao povo, entregar ao grande capital e aos grandes grupos económicos», rematou.