Subsídios pr'ás calendas

A saga dos prazos para a reposição dos subsídios de férias e de Natal parece não ter fim. O que começou por ser um roubo, perdão, um «corte» apenas para 2012 e 2013, passou nos últimos tempos – desde que Peter Weiss admitiu o seu extermínio – para meados de 2014, a seguir para o final desse ano, mais tarde para 2015... A versão mais curiosa data da semana passada, foi proferida no Parlamento por Passos Coelho e tem a particularidade de não apontar data nenhuma. «A reposição dos subsídios de férias e de Natal será feita após o período de vigência do programa de assistência económica e financeira de forma gradual, em condições que são nesta altura impossíveis de antecipar», disse o primeiro-ministro, que foi mesmo ao ponto de rejeitar fazer «exercícios de adivinhação» sobre a matéria. Ou seja, Passos, que não se cansa de afirmar que não pedirá «nem mais tempo, nem mais dinheiro» à troika, afinal não sabe (nem adivinha) durante quanto tempo o País precisará de assistência – já que no respeitante ao actual programa as datas estão definidas – nem tem certezas, ao contrário do que propagandeia, da respectiva «eficácia». E tanto assim é que, segundo as suas próprias palavras, os subsídios «serão repostos na medida das condições do País», esperando que seja por uma «restituição intensa». O que isso seja nem ele sabe: «Não vale a pena estar a perder tempo a conjecturar sobre o ritmo ou a forma como os subsídios irão ser repostos».

É caso para dizer que, com esta espécie de não calendário, o regresso dos subsídios está remetido para as calendas gregas.

 

A data que não é data

Também o regresso de Portugal aos mercados para se financiar a juros tidos por normais, prometido pelo ministro Vítor Gaspar para 23 de Setembro de 2013, afinal não é certo. Denotando uma manifesta dificuldade em lidar com o conceito de data – que antes do mais expressa um dia, mês e ano preciso – Passos Coelho assegurou no Parlamento que a data apontada pelo seu ministro das Finanças «não significa uma data em absoluto». Ai não? O que significa então? O chefe do Executivo explicou: «Mais do que a data de Setembro de 2013, que é a data em que se vencem essas obrigações do Tesouro [sem empréstimo da troika], o que é importante é o Governo ir evidenciando no País os bons resultados que nos permitam regressar ao mercado para garantir o cumprimento destas obrigações». Este conceito de data tipo flutuante, só para estrangeiro ver, é no mínimo estranho. E faz lembrar a história do associado do clube que lavrou para a acta um lapidar protesto ao constatar que «há sócios que não são sócios que estão sentados e sócios que são sócios que estão de pé».

 

Conselho de comentador

O comentador e ex-líder do PSD, Marcelo Rebelo de Sousa, aproveitou o seu tempo de antena na TVI para lançar um aviso ao seu correligionário de partido Passos Coelho: não se exponha tanto que quanto mais fala mais se enterra. É claro que o professor não disse a coisa assim, mas o sentido foi esse, ao assinalar que tanta entrevista (vai para mais de duas dezenas) e declarações «de manhã, à tarde e à noite» têm o efeito perverso de pôr a nu as «contradições» do discurso. Para o professor, o primeiro-ministro devia arranjar «alguém que fale por ele» para «não se desgastar». Brilhante. E a gente a pensar que Marcelo ia aconselhar Passos a falar verdade!

 



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