«O Portugal de ontem e de hoje»
Escolher representantes dignos que honrem e dignifiquem o País
A mesa da sessão, que decorreu no dia 22 no Clube Estefânia, em Lisboa, foi composta pelo Almirante Martins Guerreiro, Hélder Madeira, Vítor Dias e Levy Baptista, presidente da Assembleia Geral da URAP, que fez a contextualização sócio-política do III Congresso da Oposição Democrática realizado em Aveiro, em 1973. As intervenções estiveram a cargo do Almirante Martins Guerreiro, de Vítor Dias e de Encarnação Raminho, participantes no Congresso. Pedro Coelho, igualmente convidado, não pôde estar presente.
Recorde-se que o Congresso de Aveiro reuniu, de 4 a 8 de Abril de 1973, cerca de quatro mil opositores ao regime fascista, de vários sectores ideológicos, tendo sido um momento importante da luta contra a ditadura. A iniciativa ficou marcada pelas cerca de 200 teses apresentadas no Cineteatro Avenida, muitas delas colectivas, e por uma brutal carga policial nas ruas, aquando da romagem ao túmulo de Mário Sacramento.
Depois de historiar a importância do movimento democrático em 1969 e de como essa «experiência de unidade e convergência na elaboração do programa eleitoral da CDE em Lisboa e de uma campanha incisiva penetrou mesmo na Escola Naval», Martins Guerreiro contou como 13 militares estiveram presentes em Aveiro. Os jovens oficiais da Marinha, que «desde o início dos anos 70 se vinham organizando de forma autónoma e sistemática, elaboraram um programa político e uma estratégia de acção de modo a consciencializar os militares da Armada para a mudança do regime e para a resolução do problema da guerra colonial por via política», afirmou.
«O Congresso, as suas teses e conclusões prepararam as pessoas para acontecimentos futuros. Nós, militares, beneficiámos disso e sentimo-lo de uma forma inesquecível quando o povo no dia 25 de Abril veio para a rua. O Congresso marcou indelevelmente do ponto de vista político o caminho da nossa acção militar; inspirou o programa do MFA, esse foi o seu melhor fruto e talvez inesperado para os organizadores», acrescentou.
Questionando como reagir ao facto de os «três D's do Programa do MFA (democratizar, descolonizar e desenvolver)» estarem a ser neste momento substituídos pelos «três D's da troika e dos seus agentes em Portugal: desorganizar, desmantelar e destruir», o orador concluiu que «hoje é claro e transparente que os membros do Governo não têm idoneidade para o desempenho das funções que exercem, nem o Presidente da República está à altura da sua função».
Para o Almirante Martins Guerreiro há que dizer «basta», «levantar cabeça, superar o medo, enfrentar o poder financeiro e os seus agentes, com inteligência, estratégia adequada, determinação e coragem» e por isso «impõe-se a realização de eleições». «Saibamos escolher representantes dignos que honrem e dignifiquem o País», concluiu.
Dignificar a mulher
Nos quatro dias em que decorreu o Congresso, cuja Comissão Nacional tinha 500 membros e foi aberto pelo aveirense Álvaro Seiça Neves, os problemas dos trabalhadores, da juventude, da mulher, da intelectualidade, das liberdades, da guerra colonial, dos sindicatos, do ensino e da cultura, entre outros, foram tratados.
Encarnação Raminho falou da tese que apresentou, em co-autoria com Marília Villaverde Cabral, intitulada «Estrutura e Transformação das Relações de Trabalho», que versava sobre o «tratamento da mulher, condições de vida, condições de trabalho e desigualdade de tratamento no sector e escritórios».
Trabalhando num sector quase exclusivamente feminino – a Previdência Social, Encarnação Raminho lembrou várias outras teses apresentadas ao Congresso que incidiram sobre o tema da Mulher, nomeadamente no «trabalho doméstico, as diferentes remunerações, ritmos de trabalho, assistência médica, protecção na maternidade».
A autora relatou que no Congresso muitas outras teses abordaram o tema da mulher, dando como exemplo as teses dos grupos de Mulheres Democratas do Distrito de Setúbal, de Operárias de Guimarães e de Mulheres do Movimento Democrático de Mulheres, da arquitecta Catarina Sampaio e da jurista Laura Lopes.
Depois de afirmar que «as conclusões do Congresso fizeram em 1973 o ponto da situação política e económica do país», Encarnação Raminho referiu a situação actual, volvidos 40 anos, em que o «retrocesso tão acentuado e violento provocado pelas forças reaccionárias» nos leva novamente a «uma situação trágica» em que grassa o «desemprego e o roubo desenvergonhado das pensões e dos rendimentos familiares». E terminou com um apelo: «Face à situação que se nos apresenta, o caminho tem de ser a continuação da luta».
Encontro alargado
Vítor Dias, da organização do III Congresso, destacou o facto do encontro ter tido realmente o mérito de ser muito alargado, muito democrático. Dentro do pluralismo existente, o orador apontou o facto de as teses apresentadas sobre a caracterização do marcelismo serem opostas, conforme os interlocutores, e lembrou a classificação do PCP, diferente da maioria, que o apelidava de «demagogia liberalizante». Para o Partido, disse, era preciso abrir no País um novo curso político diferente do que a demagogia liberalizante apontava.
Referindo-se ao PS, Vítor Dias considerou que em 1973 as posições apresentadas por aquele partido divergiam em muito das que tinha tomado em 1969, e que tinham rompido a coesão.
Depois de destacar a participação maciça de jovens, mulheres e trabalhadores em geral, que assistiram e participaram nos quatro dias de Congresso, defendeu que já nessa data existia um manancial político que no ano seguinte desabrochou no MFA.
Derrubar o Governo
Perante uma assistência de cerca de 150 pessoas, algumas das quais em representação de organizações, tomaram a palavra, entre outros, Aurélio Santos, Domingos Abrantes, João Neves, Rodrigo de Freitas, José da Encarnação e Glória Marreiros.
Aurélio Santos sublinhou a importância da unidade no Congresso de Aveiro e no Movimento das Forças Armadas para o derrube do governo, lembrando que essa unidade tem de existir novamente se quisermos deitar a baixo o Governo de Passos Coelho; Domingos Abrantes citou Karl Marx para evocar os resistentes anónimos e falou sobre as diversas formas de contestação aos poderes instituídos, para concluir num apelo à unidade.
João Neves, de Setúbal, Rodrigo de Freitas, de Leiria, Abílio Fernandes, de Évora, salientaram as conclusões do Congresso e aspectos da organização, agradecendo a muitas figuras locais; José Encarnação apontou as similitudes da situação política de 1973 com a de 2013 e apelou também à unidade de acção.
Para finalizar, Glória Marreiros agradeceu a presença de todos, e como membro dos corpos gerentes do Clube Estefânia e sócia da URAP apelou aos presentes, incluindo os jovens, para que promovam a renovação e a dinamização dos quadros das duas organizações.