Comentário

Uma luta que amadurece

Maurício Miguel

Na medida em que se aprofunda a crise na UE, tocando à porta não apenas de países de economias mais frágeis como a de Portugal mas igualmente de algumas das suas grandes potências, nomeadamente da França e da Itália, mas também da Alemanha, acentuam-se as suas contradições enquanto projecto dominado pelo grande capital transnacional e pelas grandes potências. Uma crise inseparável da sua natureza capitalista e logo dos seus limites históricos, um rumo económico, social e político cada vez mais incompatível com a manutenção de direitos e conquistas democráticas dos trabalhadores e dos povos, e com o seu inalienável direito ao desenvolvimento e ao progresso. Uma crise que não resulta apenas das suas leis e contradições internas, mas da resistência e da luta dos trabalhadores e dos povos contra o aumento da exploração e o empobrecimento, da luta crescente contra a própria UE e por uma outra Europa de paz e justiça social.

Um projecto que se consolida no aprofundamento do neoliberalismo, do federalismo e do militarismo, centrado na exploração dos trabalhadores, na destruição das soberanias nacionais, na imposição da livre circulação de capitais, na conquista de mercados internacionais, no controlo de rotas e matérias-primas, na subordinação à NATO.

Neste tempo que nos cumpre viver, as condições de acumulação de capital para os grandes grupos económicos impõem-nos valores crescentes e alarmantes de desemprego e de pobreza, a precariedade, a redução dos rendimentos dos trabalhadores e de direitos democráticos, um retrocesso de dimensão civilizacional.

Trabalhadores não desarmam

Enfrentando pressões, chantagens e apelos sistemáticos ao conformismo, os trabalhadores não desarmam na luta por direitos e conquistas que correspondam à riqueza por si criada, e aos conhecimentos científico-tecnológicos existentes. Ancorados na necessidade objectiva do reforço da luta para derrotar um projecto cada vez mais contrário aos seus interesses, e do exemplo e estímulo persistente do seu desenvolvimento em outros países e do papel decisivo do reforço da sua organização, a luta de massas aí está bem viva e capaz de amadurecer para se constituir como motor de transformação social. Uma luta que se estende a países da UE onde era até agora pouco expressiva ou menos combativa, não tendo ainda adquirido uma dimensão marcadamente de massas como vem sendo o caso de países como Portugal.

Uma luta temida pelo grande capital que, por seu lado, não desarma na procura de lhe impor um freio, de a controlar ou de, caso seja necessário, de a proibir. Cumpre-nos recordar o papel instrumental da UE, dos seus tratados e políticas, nomeadamente na área da Justiça e Assuntos Internos com este objectivo, impondo graves limitações à soberania nacional através da transposição de normas e princípios contrários ao direito nacional e aos princípios consagrados na Constituição da República Portuguesa que defende e garante direitos, liberdades e garantias de todos os portugueses mas em particular dos trabalhadores. Um pouco por toda a EU, os trabalhadores sentem as limitações e violações crescentes dos seus direitos, nomeadamente do direito à greve, à manifestação, à contratação colectiva, à acção sindical, e as alterações aos sistemas de Justiça  que limitam o acesso ou se colocam cada vez mais do lado do capital e contra os trabalhadores. Convém ainda lembrar os acordos e cumplicidades da UE e de muitos dos governos dos países que a integram, incluindo Portugal, relativamente aos chamados voos da CIA, um programa de sequestro, transporte ilegal de prisioneiros ou suspeitos, a banalização da tortura, invocando o suposto combate ao terrorismo.

Outro exemplo é o da política comum de imigração que destituiu as soberanias nacionais dessa competência, impondo a repressão e a criminalizarão dos imigrantes, impondo uma UE fortaleza, terreno fértil para o tráfico de seres humanos por organizações criminosas, realidade que continua a constituir um drama para milhares de seres humanos. Uma UE cada vez mais hipócrita, que procura escamotear responsabilidades próprias, sendo disso exemplo o alarme face ao regresso de cidadãos de países da UE que viajam para «zonas de conflito» e ingressam em organizações terroristas. Convém lembrar a desfaçatez de quem se refere a uma ameaça, lavando as mãos da responsabilidade de ter apoiado essas organizações terroristas através do fornecimento de armas, treino e financiamento, visando a desestabilização da Síria.



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