Estilos

Jorge Cordeiro
Quando à dias alguém se referiu à actual Ministra da Saúde sublinhando o mérito de «ter conseguido manter o rumo da política do seu antecessor ao mesmo tempo que conseguira atenuar o largo descontentamento que este gerara» bem perto ficou da elaborada operação que o PS construiu para tentar, mantendo o rumo da sua política, iludir pelas aparências os objectivos da sua acção. A coisa parece resultar e fazer escola. Depois da radical substituição de uma assumida e ostensiva arrogância patenteada em quatro anos de governação por um apressado comprometimento, em vésperas de eleições, expresso na surpreendente contrição do primeiro-ministro e subsequente promessa de uma conduta futura marcada pela delicadeza, Mário Soares veio agora aduzir uma nova qualidade que segundo ele o futuro Governo deverá assumir: a maleabilidade. Adeptos daquele princípio de sobrevivência política que se poderia resumir a um conhecido ditado, mas já na versão socialista de «mais vale torcer que partir», o PS acrescentou à ciência política esse novo conceito que em física adoptaria o nome de ductilidade (para definir a propriedade de alguns corpos de se adaptarem a novas formas sem quebrar) e que no léxico do PS pode menos eruditamente ser definido como contorcionismo. Uma propriedade capaz de levar o PS a dizer ontem o contrário que hoje faz; a alternar de acordo com as circunstância do momento entre o bruto e o delicado; a simular no que diz o que realmente se propõe ou está a fazer; o de levar, do jeito que mais adequadamente se propiciar, a água ao moinho da política de direita. Nada melhor do que conseguir manter o rumo sem sobressaltos dispensáveis, pensará a esta hora Ana Jorge, depois da entrega do futuro hospital de Vila Franca de Xira ao Grupo Mello. Numa cajadada, dois coelhos; um passo mais na privatização da saúde que Correia de Campos havia deixado preparado; a conveniente desculpa construída na base do «antes assim que pior» para justificar aquelas alterações ao concurso que, salvando para os privados o essencial, até dão ares de empenho na defesa do que devia ser público. Meros exercícios de estilo para iludir conteúdos.


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